Uma voz clama no deserto: Fé na
ousadia de Deus! (Mc 1,1-8)
Esta reflexão é sobre o segundo
domingo do Advento. Advento é tempo de reflexão diante do plano de Deus para a
humanidade. É tempo de refletir como estamos orientando nossas vidas em relação
ao propósito de Deus. Advento também é vinda, chegada. Ele vem. Jesus vem!
É um período especial, pois antecede
o Natal, e traz nada menos que três desafios à cristandade. Esse período (1)
quer nos lembrar do Advento histórico, passado. (2) Quer nos lembrar do Senhor
que quer ser, hoje, nosso hóspede, portanto, o aspecto presente. (3)
Finalmente, quer nos remeter ao futuro: o aspecto escatológico do mesmo.
O Advento é época de recuperar os
grandes feitos de Deus. Eles são fundamentais para a nossa fé cristã e
orientadores para a nossa convivência na comunidade e no mundo, em testemunho e
serviço. Recuperar os fatos, no Advento, significa, conforme Isaías, novo
fascínio, força e vigor para superar nossos cansaços, desesperanças, desânimo,
vontade de desistir e cultivar nossa fé - esperança no Senhor. Advento é
esperança na renovação de todas as coisas, na libertação das nossas misérias,
pecados, fraquezas. É esperança que nos forma na paciência diante das
dificuldades e tribulações da vida, diante de tantas coisas que afligem nossa
alma e ferem nosso corpo.
Advento é, por isso, época de não
só pensar em doces e presentes, mas, acima de tudo, é convite para olhar em
direção ao que realmente importa, ou seja, a oferta da vida com esperança, em
Cristo Jesus. É tempo de encontrar o novo.
O "evangelho" de Jesus
não vem dos palácios
Os primeiros versos do Evangelho
segundo Marcos retomam a profecia do Antigo Testamento e a conduzem ao Novo, ao
evento do Espírito. O Espírito perfaz o novo! Marcos ressalta que Jesus Cristo,
o Filho de Deus, é a Boa Nova da salvação para a humanidade. Como o mensageiro
antigo (Isaías 52,7), João Batista proclama o alegre anúncio, que culmina em
Jesus (Marcos 1,14-15) e ressoa nas comunidades cristãs como apelo a anunciar a
mensagem de libertação no mundo inteiro (Marcos 13,10; 14,9).
Sabe-se que, para o evangelista,
as palavras e ações de Jesus são "evangelho". "Evangelho" é
uma palavra que era utilizada pelas autoridades para anunciar as suas ações.
Contudo, para o evangelista Marcos, o "evangelho" de Jesus não vem
dos palácios, mas da periferia de Nazaré (W. Marxen). O evangelho é alegria, não
é imposto, como o evangelho imperial. Aqui nos é apresentado Jesus Cristo como
"Filho de Deus", uma expressão que é central para o Evangelho segundo
Marcos (cf. Marcos 1,11; 15,39).
Em seguida, Marcos 1,2-8
apresenta o precursor, João Batista. Jesus está na linha da profecia! João
Batista é o profeta anunciado em Isaías. Restaura Israel a partir do deserto,
como Moisés o fez com o povo que saiu do Egito, como tinha sido a prática de
Elias no Horebe. João Batista, o profeta, tem seu foco no deserto. Para a
história de Israel, o deserto é símbolo de vida, de resistência, vida
restaurada, nova.
A profecia de João Batista apela
à conversão, ao arrependimento. Isso é antiga tradição profética. O
arrependimento é o eixo da renovação.
Fé na renovada ousadia de Deus e
olhos fixos no futuro
O povo de Deus sempre teve os
olhos fixos no futuro, com esperança na vinda definitiva do Senhor (Isaías).
Marcos nos chama a olhar à nossa volta e enxergar dentro de nossa história a
vinda de Deus: João é o novo Elias (1 Reis 1,8), isto é, a profecia que volta a
ser proclamada, o povo se reúne e se organiza para recomeçar como nos tempos do
"deserto", enquanto os poderosos se abalam por se sentirem
desmascarados (Mateus 3,7). Em Jesus de Nazaré, é Deus mesmo quem opera a
restauração das pessoas.
Assim como se deu com Elias, João
foi perseguido e morto covardemente, mas a palavra ressurge em Jesus (Marcos
1,14-15; 6,16). Também Jesus foi perseguido e assassinado, mas a caminhada da
Palavra prossegue com seus discípulos e discípulas.
Ouvir de Elias, de João, de
Jesus... é ouvir falar da renovada ousadia de Deus, a ousadia da liberdade, que
não aceita calar-se nunca, nem teme os poderosos do mundo. Sempre de novo a
Palavra ressurge para anunciar que são possíveis "novos céus e nova terra"
(2 Pedro 3,13; Marcos 1,9-13; 9,2-13). A Palavra volta a levantar-se para
denunciar os obstáculos que se antepõem ao propósito de Deus e proclamar que só
há uma maneira de viver nessa nova realidade: "endireitar" os
caminhos, reconhecer os erros pessoais e coletivos, refazer as relações pelo
perdão, a igualdade e a partilha (Lucas 3,10-14). Aí, sim, o
"deserto" se transforma em larga estrada, em jardim do Senhor.
O deserto era o lugar onde
frequentemente se refugiava quem se sentia à margem do sistema e se punha na
oposição. Lá estavam os essênios, pessoas que romperam com o templo e se
consideravam vanguarda do novo povo. Para lá se dirigia quem se proclamava
profeta ou messias e pretendia organizar a resistência popular. Por lá andavam
guerrilheiros (sicários, zelotas) e bandidos. O movimento de João é de protesto
e resistência, por isso foi preso e morto. Herodes o temia.
Batismos e rituais de
purificações eram práticas comuns no ambiente dos fariseus e dos essênios. No
movimento de João não são os sacrifícios que purificam do pecado, mas a
confissão e o arrependimento, a mudança de vida. O povo não peregrina em
direção ao templo, mas sai das cidades, como num êxodo, em direção ao deserto.
É como se fosse preciso sair de novo do Egito, "a casa da servidão".
E, pelo Jordão, entrar na Terra Prometida. Sob a expressão "remissão dos
pecados" está escondida a antiga esperança da "remissão das
dívidas" prevista para o Ano do Jubileu (Levítico 25). O novo tempo
anunciado por João é a possibilidade, com Jesus, de restauração radical da
convivência do povo em sociedade, segundo os ideais da igualdade e da justiça.
Para isso é que se prevê a "imersão" (batismo) no Espírito Santo.
Será como passar pelo fogo (Mateus 3,11; Malaquias 3,2) que purifica e destrói,
para que algo novo possa surgir. Essa novidade era esperada desde o final do
exílio na Babilônia e é dela que falavam profetas e profetisas no grupo de
discípulos de Isaías (Is 40-66).
Deus sabe o caminho que devemos
andar
João Batista, o precursor, propõe
a conversão como meio para preparar o caminho do Senhor e acelerar a chegada de
um mundo novo de justiça. Deus caminha pelo deserto da história, ensinando-nos
a endireitar as veredas através de gestos solidários de amor e paz.
Dietrich Bonhoeffer dizia:
"Eu não entendo os Teus caminhos, Senhor. Mas Tu sabes os caminhos que
devo andar!" E é verdade! Deus sabe o caminho que devemos andar. Sabe,
quanto mais procuro vivenciar e entender as coisas que Deus quer de mim, mais
me surpreende o quanto Deus vem ao meu, ao nosso encontro nas áreas mais
essenciais e carentes da vida: "significado, pertencimento, saúde,
liberdade e comunidade". É que Deus - que é um Deus de amor e,
consequentemente, de salvação - vem ao nosso encontro nas áreas mais
necessitadas da existência humana e comunitária.
Por isso, "Ficai atentos,
preparem-se". Ficai Atentos! A Esperança não pode esmorecer, mas resistir.
Esperança Teimosa! Nascida do discernimento. Construída mesmo no tempo de
sofrimento e esmorecimento! O tempo que vivemos é tempo de resistir pela
solidariedade ao egoísmo e ao individualismo que nos consomem. Ser sensível é
ser humano! Olhar o mundo sem indiferença. Com compaixão e afeto que movam à
transformação! Vivamos intensamente este Tempo do Advento! Pois o Advento nos
ensina: Não canse de esperar, o que esperamos vai chegar!
Odete Liber de Almeida Adriano (texto publicado pelo CEBI, no site http://www.cebi.org.br/noticia.php?secaoId=21¬iciaId=2578
Gostei do seu blog, não consegui te seguir.
ResponderExcluirbjos
Lilian, estou parendendo alidar com isso... Obrigada. Bj
ExcluirAceito sugestões
Ops. Errei. Estou aprendendo a lidar com isso. Bj
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