Há uma música
popular que diz: "Ainda vai levar um tempo, pra fechar o que feriu por
dentro. É natural que seja assim.." E é verdade. Minha mãe sempre disse
que leva um tempo para curar feridas, dores, doenças. Sarar leva tempo. E ainda
há as surpresas, a lei de Murphy, que quando a gente pensa que sarou, bate no
machucado e ele sangra, incha novamente. Começa tudo de novo. Curativo, band-aid,
passar a pomada ou voltar ao médico. Pois é! Segue o tratamento, enquanto não
sara de vez, vamos seguindo com um pouquinho de dor, cuidado... E para piorar,
as vezes, a gente bate no machucado já dolorido, e a batida é muito forte, e choramos
de novo a mesma ferida, porque abriu, sangrou, doeu, e parece que nunca cicatrizará. E a vida vai
seguindo... Porém, num belo dia, a gente acorda e ali está só a marca, a
cicatriz.Tenho várias cicatrizes de cortes que adquiri jogando bola, pisando em
caco de vidro no gramado... Essas marcas nos trazem a memória também bons
momentos, foram doidos, mas bons. A cicatriz nos recorda o que passamos e
também nos lembram que é impossível esquecer. Porém, a marca da cicatriz é apenas
lembrança, e não doerá novamente. Lembramos da dor e dos momentos, mas já não sentimos
nada. As cicatrizes são a graça de Deus que nos mostram que a cura é possível. Que
uma ferida pode sangrar, doer muito hoje, mas amanhã, após a cura, vai ser
diferente... Claro que leva um tempo, mas esse tempo é “kairós”, porque é tempo
de Deus e sua cura virá, como o alvorecer da aurora, como disse o profeta
Isaías. A cura será resplandecente, brilhante como o sol. E ficaremos tão
deslumbrad@s com ela que nem sentiremos quando o sol secar nossas lágrimas.
Lembrando que lágrima é a dor derretida e curativa. E a vida segue, apenas com
as marcas, as cicatrizes, que se tornaram apenas lembranças, experiência.
Lembranças que nos tornaram melhores, mais fortes. Assim esperamos! Odete Liber
"É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto, como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo..." (Clarice Lispector)
terça-feira, 11 de julho de 2017
domingo, 2 de julho de 2017
Cheiros e Aromas
Hoje, um belo domingo,
fiz tudo que não planejei. Havia planejado ir à igreja cedo, depois voltar pra
casa e andar na praia... Pois bem, acordei cedo e fui fazer relatório final pra
reunião de amanhã, a qual não estarei presente. E lá se foi mais uma manhã...
Almocei. Depois fui
olhar minhas plantas, sentir o cheiro de algumas, o céu lá fora cinza, dia de
uma chuva fina... E com isso viajei. E pra você, como é pegar aquele tempo ou ter o cheiro dele? Lembrar da infância,
de quando a gente ia para escola ? os primeiros amores platônicos? Nesses casos
a memória remete as cores, aos sabores e aos sentimentos. Lembra da dança, da brincadeira, do fim da
tarde, os sorrisos na roda e aquele toque? Lembrar do que já tivemos, fizemos,
sonhamos e não realizamos, das surpresas da vida?
É o tempo tem dessas coisas de guardar tudo em um baú vivo, a gente, de
modo que não há outra maneira de acessá-lo se não entrando nele e se deixando
tocar por tudo que está em seu fundo. Esse fundo que não está longe da gente,
pois está aqui grudado, colado em nós, porque o tempo é coisa de narrador e quem
narra faz a história viver. E me recordei de tanta coisa. Momentos bons, outros
nem tanto, outros ruins, outros maravilhosos...
Por isso, te proponho que
experimente olhar pra você, pro seu báu e experimente, proponho que feche os seus
olhos e vá para aquele lugar onde tudo começou, mas pode, se quiser, ir para um
pouco antes ou um pouco depois, afinal não importa o ponto de partida porque é
na viagem que a gente se encontra, se emociona, faz lágrimas correrem e risos
aparecerem.
E nessa viagem para o passado, selecione o que for possível, capte as
intensidades, reviva as sensações, as emoções, o calor ou o frio, o estado de
estar e sinta o que puder. Sinta e revivencie, pegue-a e transforme em
experiência. De olhos ainda fechados e consciente da respiração, reveja nas
arestas desse lado de lá os desdobramentos dos acontecimentos, as aparências em
suas essências, como espumas do mar que guardam oceanos. Os cheiros, aromas. Banhe-se e na pele, na
flor da pele, perceba a mistura se dando, o encontro avançando e os elos se
formando, como correntes que não prendem, mas que puxam, transmitem e
interligam. Ou então como laços que não amarram, mas que unem e aproximam,
mesmo na distância dos intervalos. Se emocione, viva e continue.
Continue de olhos fechados, sonhando, imaginando, busque outros lugares,
outros pontos, que até podem não ser tão doces assim, porque por vezes vem a
observância de um medinho, de uma ânsia, de confusões, mas no geral há uma
calma e confortável sabedoria de que tudo vale a pena. Voltar vale a pena!
Então como uma roda de bicicleta que gira fazendo barulhinho, zunindo naquele
silêncio sem pressa, lembre do sorriso espontâneo, por nada e por tudo. E o
gosto da bebida ou comida , de um perfume que se vai sem mesmo saber que se
foi, mas ainda sim saber que foi bom!
Então, não é que temos mesmo o nosso próprio tempo!
Viajar no tempo, trazer a memória momentos passados é se deixar cair e aos poucos se permitir
olhar pro passado como experiência. Lembrar de pessoas queridas, porque o
vínculo perdura, atravessa o tempo, liga como cola e cola porque corresponde,
um dizendo sim e o outro também. Ter o próprio tempo, o nosso, é antes um compartir,
um partir juntos para algum lugar. De olhos fechados, inspirando e expirando
tudo isso, ter o nosso próprio tempo é indizível, impalpável, proibido até, mas
é revivido no privilégio de um retorno encontro sempre atualizado. E nos fazer
rememorar momentos, cheiros que se passaram mas que guardamos dentro de nós e
os tornamos presente em nosso tempo. Vida que segue, relembrando o que foi, o
que escorreu pelas nossas mãos, saudades que permanecem, amor que ficou
guardado no fundo, vitórias e derrotas, mas em tudo uma aprendizagem,
crescimento!
Pois bem, com isso, o tempo não é
bom agricultor. Não é a função dele. O tempo só passa. Quem tem que arar o
solo, somos nós. Quem arranca plantações é o vento; Quem faz crescer é a chuva.
O tempo… Só passa e a gente segue a caminhada da vida, com cheiros e aromas...
Odete Liber
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