terça-feira, 11 de julho de 2017

Cicatrizes



Há uma música popular que diz: "Ainda vai levar um tempo, pra fechar o que feriu por dentro. É natural que seja assim.." E é verdade. Minha mãe sempre disse que leva um tempo para curar feridas, dores, doenças. Sarar leva tempo. E ainda há as surpresas, a lei de Murphy, que quando a gente pensa que sarou, bate no machucado e ele sangra, incha novamente. Começa tudo de novo. Curativo, band-aid, passar a pomada ou voltar ao médico. Pois é! Segue o tratamento, enquanto não sara de vez, vamos seguindo com um pouquinho de dor, cuidado... E para piorar, as vezes, a gente bate no machucado já dolorido, e a batida é muito forte, e choramos de novo a mesma ferida, porque abriu, sangrou, doeu,  e parece que nunca cicatrizará. E a vida vai seguindo... Porém, num belo dia, a gente acorda e ali está só a marca, a cicatriz.Tenho várias cicatrizes de cortes que adquiri jogando bola, pisando em caco de vidro no gramado... Essas marcas nos trazem a memória também bons momentos, foram doidos, mas bons. A cicatriz nos recorda o que passamos e também nos lembram que é impossível esquecer. Porém, a marca da cicatriz é apenas lembrança, e não doerá novamente. Lembramos  da dor e dos momentos, mas já não sentimos nada. As cicatrizes são a graça de Deus que nos mostram que a cura é possível. Que uma ferida pode sangrar, doer muito hoje, mas amanhã, após a cura, vai ser diferente... Claro que leva um tempo, mas esse tempo é “kairós”, porque é tempo de Deus e sua cura virá, como o alvorecer da aurora, como disse o profeta Isaías. A cura será resplandecente, brilhante como o sol. E ficaremos tão deslumbrad@s com ela que nem sentiremos quando o sol secar nossas lágrimas. Lembrando que lágrima é a dor derretida e curativa. E a vida segue, apenas com as marcas, as cicatrizes, que se tornaram apenas lembranças, experiência. Lembranças que nos tornaram melhores, mais fortes. Assim esperamos! Odete Liber


domingo, 2 de julho de 2017

Cheiros e Aromas

Hoje, um belo domingo, fiz tudo que não planejei. Havia planejado ir à igreja cedo, depois voltar pra casa e andar na praia... Pois bem, acordei cedo e fui fazer relatório final pra reunião de amanhã, a qual não estarei presente. E lá se foi mais uma manhã...
Almocei. Depois fui olhar minhas plantas, sentir o cheiro de algumas, o céu lá fora cinza, dia de uma chuva fina... E com isso viajei. E pra você, como é pegar aquele tempo ou ter o cheiro dele? Lembrar da infância, de quando a gente ia para escola ? os primeiros amores platônicos? Nesses casos a memória remete as cores, aos sabores e aos sentimentos.  Lembra da dança, da brincadeira, do fim da tarde, os sorrisos na roda e aquele toque? Lembrar do que já tivemos, fizemos, sonhamos e não realizamos, das surpresas da vida?
É o tempo tem dessas coisas de guardar tudo em um baú vivo, a gente, de modo que não há outra maneira de acessá-lo se não entrando nele e se deixando tocar por tudo que está em seu fundo. Esse fundo que não está longe da gente, pois está aqui grudado, colado em nós, porque o tempo é coisa de narrador e quem narra faz a história viver. E me recordei de tanta coisa. Momentos bons, outros nem tanto, outros ruins, outros maravilhosos...
Por isso, te  proponho que experimente olhar pra você, pro seu báu e experimente, proponho que feche os seus olhos e vá para aquele lugar onde tudo começou, mas pode, se quiser, ir para um pouco antes ou um pouco depois, afinal não importa o ponto de partida porque é na viagem que a gente se encontra, se emociona, faz lágrimas correrem e risos aparecerem.
E nessa viagem para o passado, selecione o que for possível, capte as intensidades, reviva as sensações, as emoções, o calor ou o frio, o estado de estar e sinta o que puder. Sinta e revivencie, pegue-a e transforme em experiência. De olhos ainda fechados e consciente da respiração, reveja nas arestas desse lado de lá os desdobramentos dos acontecimentos, as aparências em suas essências, como espumas do mar que guardam oceanos.  Os cheiros, aromas. Banhe-se e na pele, na flor da pele, perceba a mistura se dando, o encontro avançando e os elos se formando, como correntes que não prendem, mas que puxam, transmitem e interligam. Ou então como laços que não amarram, mas que unem e aproximam, mesmo na distância dos intervalos. Se emocione, viva e continue.
Continue de olhos fechados, sonhando, imaginando, busque outros lugares, outros pontos, que até podem não ser tão doces assim, porque por vezes vem a observância de um medinho, de uma ânsia, de confusões, mas no geral há uma calma e confortável sabedoria de que tudo vale a pena. Voltar vale a pena!
Então como uma roda de bicicleta que gira fazendo barulhinho, zunindo naquele silêncio sem pressa, lembre do sorriso espontâneo, por nada e por tudo. E o gosto da bebida ou comida , de um perfume que se vai sem mesmo saber que se foi, mas ainda sim saber que foi bom!
Então, não é que temos mesmo o nosso próprio tempo!
Viajar no tempo, trazer a memória momentos passados  é se deixar cair e aos poucos se permitir olhar pro passado como experiência. Lembrar de pessoas queridas, porque o vínculo perdura, atravessa o tempo, liga como cola e cola porque corresponde, um dizendo sim e o outro também. Ter o próprio tempo, o nosso, é antes um compartir, um partir juntos para algum lugar. De olhos fechados, inspirando e expirando tudo isso, ter o nosso próprio tempo é indizível, impalpável, proibido até, mas é revivido no privilégio de um retorno encontro sempre atualizado. E nos fazer rememorar momentos, cheiros que se passaram mas que guardamos dentro de nós e os tornamos presente em nosso tempo. Vida que segue, relembrando o que foi, o que escorreu pelas nossas mãos, saudades que permanecem, amor que ficou guardado no fundo, vitórias e derrotas, mas em tudo uma aprendizagem, crescimento!
Pois bem, com isso, o  tempo não é bom agricultor. Não é a função dele. O tempo só passa. Quem tem que arar o solo, somos nós. Quem arranca plantações é o vento; Quem faz crescer é a chuva. O tempo… Só passa e a gente segue a caminhada da vida, com cheiros e aromas...

Odete Liber