quinta-feira, 30 de abril de 2020

É porque Deus nos ama que devemos nos amar


É porque Deus nos ama que devemos nos amar
I João 5.1-5
Que a graça e a paz de nosso Senhor Jesus Cristo esteja com todos @s irm@s que estão lendo esta prédica! Os textos bíblicos nos falam de amor, serviço, fé. Ambos resumem-se em: "Há um só Evangelho para tod@s, e tod@s precisam amar a Deus e ao próximo com atos concretos"!
O texto de Atos nos diz que a palavra é pregada e que precisamos ter a capacidade de ver o mundo, a igreja e a nossa vida a partir da perspectiva de Deus.  Deus está dizendo a todos que vivem além da barreira da separação de Deus, que a vida em Jesus e a presença do Espírito Santo quebra tudo que separa você de mim.  Pois uma das grandes barreira da proclamação do Evangelho no passado foi o preconceito e ainda o é nos dias de hoje. Não há um Evangelho separada para judeu e outro para gentios. O que há, é apenas um evangelho para tod@s.
No Evangelho de João 15:9-16 aprendemos que os discípulos de Jesus Cristo o servem e esse serviço não é escravidão, mas amor. Por isso para Jesus, a maior prova da existência do amor é “dar a vida pelos amigos” (v.13). Foi exatamente isto que ele fez por nós (v. 12) e é exatamente isto que ele espera que façamos uns pelos outros. Dar. “Deus amou o mundo de tal maneira que deu...)  Se amamos também seremos capazes da dar; dar nosso tempo, nossa atenção, nosso carinho, nosso abraço, nosso apoio, nossa ajuda, nosso pão, nossa compaixão, nosso perdão, enfim, nossa vida!   Em sua introdução sobre o Evangelho de João, Brakemeier escreve que esse Evangelho compromete a pregação cristã de articular, ao lado da esperança, a realidade da nova vida que, com Jesus, despontou em meio a um mundo cheio de trevas e dor.
E em I João 5:1-6, que é texto que iremos refletir especificamente nesta noite, nos leva a continuarmos a refletir assim, como os outros dois textos, sobre o tema fé e amor. O texto inicia com uma confissão de fé: Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo... (5.1a). Gira em torno das consequências práticas da confissão Jesus é o Cristo. E conclui com a afirmação (apesar de ser em tom de pergunta): Quem é que vence o mundo senão aquela pessoa que crê que Jesus é o Filho de Deus? (5.5.) A partir da confissão de fé, em torno dela e para ela, flui todo o texto.
Com certeza @s irmãos/ãs já ouviram muito falar sobre o amor e a fé. Também muito já indagaram: O que é fé? Fé é amar o próximo, mas, e daí? Como? Será que fé tem algo em comum com o amor?
Tod@s nós sabemos que Deus mostrou seu amor ao mundo, tornando-se humano, um de nós. E este ato solidário criou para nós a possibilidade de encontrarmos o próprio Deus. Deus mostrou-se solidário com sua criatura – nós.
João destaca no capítulo anterior que a fé precisa de ação e que esta ação só pode ser o amor fraternal. Com isso pode-se afirmar que no amor ao irmão ou irmã se reconhece quem pertence a Deus. É nossa fé que supera o mundo, é a nossa fé que confessa Jesus Cristo e que, como consequência, exerce o amor.
Segundo o texto, todas as pessoas que integram a comunidade confessam crer em Jesus (assim como tod@s aqui presentes). Todas confessam amar a Deus. Mas as consequências de sua fé são diferentes. O amor que brota dessa fé se revela de forma distinta. Como medir, pois, a fé autêntica? Como atestar, pois, o amor verdadeiro? Não é este um drama que nos atormenta ao longo da história da Igreja, até hoje?
Vale também frisar que crer, neste texto, significa confirmar, ficar com fé ou permanecer em Cristo. “Jesus é o Cristo” (v.1) é um credo cristológico mais simples e mais antigo dos primeiros cristãos. Em nosso texto esse credo recebe uma atenção especial. O Cristo é o homem Jesus, ou seja, não se trata de uma pessoa espiritual. E quando lemos “nascidos de Deus”, fica claro que mais uma vez Deus se encarnou.
Em vários momentos desta carta, inclusive neste texto, se lê que há critérios que apontam para a fé autêntica. Em seu início, esta perícope indica: (...) porque todo aquele que ama a quem o gerou, ama a quem dele/dela foi gerado (5.1b). Em outras palavras: quem tem amor por seu pai e/ou sua mãe, ama os filhos e as filhas por ele/ela gerados. Ama, portanto, seus próprios irmãos e irmãs; pois, pela ótica de Deus, que nos tem como filhos e filhas, somos irmãos e irmãs. Deus não nos trata como filho único ou como filhas que exigem exclusividade. Ele nos quer como a uma família, em que irmãs e irmãos se ajudam mutuamente.
De acordo com o credo, praticar o amor e os mandamentos é sinal de que se é filh@ de Deus. Amar, aqui, não tem nada a ver com sentimentos entusiásmaticos ou sentimentalistas, mas sim, sublinha a ação responsável diante do irm@, diante do mundo. É assumir as responsabilidades, as consequências dos erros/pecados e acertos.
O teólogo alemão Zink escreveu o seguinte: “Sem fé é impossível – Todo ser humano crê em algo, mesmo pensando que nada crê. Não se pode ver e provar. [...] Pois crer significa confiar. Quem crê confia, mesmo onde nada vê. Está certo da sua causa.”
Segundo Helmut Gollwitzer, confissões de fé que não tem como consequência transformações terrenas e profundas na sociedade não passam de uma questão particular que traz apenas satisfação pessoal. A Confissão de fé em Cristo deve trazer e gerar mudanças na vida das pessoas, na comunidade de fé, na sociedade. É com e apartir de  Jesus de Nazaré que é o Cristo (5.1), que é o Filho de Deus (5.5),  que está toda nossa esperança. Não é por esforço próprio que venceremos o mundo, mas pelo poder que vem dessa fé.
Então, a fé e o amor que nascem de Deus vencem o mundo, porque Deus é amor. Não é qualquer fé que vence o mundo, quem vence é a nossa fé, que é a única. Esta consciência faz com que os mandamentos não sejam penosos.
O amor cristão leva a outra pessoa a ser como Deus quer que ela seja: um ser humano criado à sua imagem.
Amar não é um cumprimento de uma lei divina, mas é reconhecer a situação do irmão no mundo, é reconhecer que o outro também quer ser tratado com justiça, amar é conseqüência do amor de Deus, o qual reconhece de uma maneira real e solidária a situação e necessidade do ser. E amar é algo para agora e não pra amanhã.
Os gestos de amor são, portanto, movidos pela gratidão a Deus. São atos de liberdade, em favor do próximo. Os mandamentos de Deus não são lei, mas apontam possibilidades concretas de amar. Confissão de fé e prática dos mandamentos são inseparáveis. Não se trata de amar por amar. O cristão sabe por que ama. Este saber, que lhe dá um poder incomum, o leva à persistência na luta e lhe dá a esperança de vencer as adversidades.
Amar e ter fé significa romper o esquema das más estruturas, ser subversivo contra a lei humana, contra os círculos viciosos de nossa sociedade. Ou seja, é estar ao lado e com os desprezados pela sociedade, os que enfrentam a dor e a solidão, a indiferença, os pobres, os marginalizados. Pois a fé e o amor que nascem de Deus vencem o mundo, porque Deus é amor.
Na fé, a pessoa nasce de novo todos os dias.  Sabemos que é no encontro com o Sublime, o Sagrado, Jesus/Deus, com o qual podemos reclamar, gritar, chorar toda lágrima, na certeza que depois iremos nos alegrar novamente, porque é na fraqueza que nos tornamos fortes. E o milagre acontece!
Sabe, a sociedade nos manda descartar o outro, porém, Deus nos ordena a carregar o outro. Para Bonhoeffer “o outro só será irmão quando se tornar um fardo, e só então deixará de ser objeto dominado. [...]. Levar o fardo do outro significa aqui suportar a realidade do outro em sua condição de criatura, aceitá-la, e, sofrendo-a, chegar ao ponto de alegrar-se com ela”.
Portanto, somente “quem carrega sabe-se carregado, e somente com esta força poderá carregar”. Seguir na caminhada cristã é mais que dizer que vc se preocupa com o social. Ser Crist@  é trocar nosso fardo pelo de Jesus, e assim nos tornamos carregadores de fardos de esperança, de justiça, de amor, de misericórdia e da paz que excede todo entendimento humano. Andar e carregar o outro é ser solidário, é andar com o outro, é se encontrar com Cristo, é fazer parte do Reino de Deus.
Porque o amor de Deus nos mobiliza, não nos dá sossego, nos põe a experimentar sapatos alheios para ver onde é que eles verdadeiramente nos apertam.. Não podemos ficar em nosso marasmo, não nos cabe permanecer indiferentes ao mundo, porque conforme canta Mercedes Sosa: “Eu só peço a Deus que a dor não me seja indiferente...” E eu digo: Só sabe o que é o amor quem experimentou Deus. Quem busca meramente a realização pessoal ou a autogratificação viverá um amor insosso, sem sabor (como chuchu.). O amor é doação, é gratuidade.
E quem ama e tem fé, “[...] crê em Deus não é um otimista. Ele não precisa do pensamento positivo. Quem crê em Deus não é pessimista. Quem ora a Deus confia em Deus.” Apenas crê como disse Moltmann.
E que, com as palavras lidas nos textos bíblicos de hoje e a palavra partilhada, tenhamos fé, esperança e amor, para que, como Igreja, e como cristãos/ãs sejamos portadores/as dos sinais do reinado de Deus e que possamos ver no mundo a esperança que o Dia do Senhor proclama. E Que Deus nos abençoe!
Odete Liber



domingo, 26 de abril de 2020

A caminhada se faz caminho com Jesus – Lucas 24. 13-35

A caminhada se faz caminho com Jesus – Lucas 24. 13-35
O contexto da história todos nós sabemos. Dois discípulos seguiam para Jerusalém. Conversavam e discutiam a respeito de  tudo que tinha acontecido. E de repete aparece outra pessoa, o próprio Jesus, mas eles não o reconhecem. Jesus, esse estranho, então os questiona sobre o que estavam conversando e  percebe que eles estavam muito tristes e decepcionados.
Os discípulos caminharam com Jesus não por um mês, mas por anos e agora, não o reconhecem. Os olhos impedidos vedam visão e compreensão. Os dois discípulos não acreditaram na informação a respeito da sepultura vazia nem a notícia dos anjos de que ele vive, mesmo que prestadas por mulheres de seu próprio círculo de convívio! Mais ainda, não reconheceram a Jesus caminhando lado a lado com eles.
Fico imaginando quantas vezes talvez eu não tenha reconhecido Jesus nessa caminhada da vida. Não são provas históricas, nem o esforço humano, nem discursos filosóficos que abrem os nossos olhos e levam o nosso espírito a reconhecer Jesus Cristo.
Como cristãos e cristãs “Cremos num Deus que não vemos e nem caminhamos no passado com Ele, mas  percebemos sua ação em nossas vidas. Temos a  fé que é dádiva.  A graça doa esperança, mesmo quando tudo está ruindo. Então, os nossos olhos se abrem e o nosso coração compreenderá: Ele vive! 
Quero também lembrar que,  sem a presença, sem o encontro pessoal, há um empobrecimento da comunicação dialógica cara a cara, diante do olhar do outro; fora desta comunicação vivente com o outro, já não é possível autentificar a experiência do nosso próprio eu, pois nos falta a relação primordial com um tu. Vivem os em dias que as relações se pautam através do whatsap, da distância. Não se olha mais olho no olho.  O processo da presença do outro, da conversação produz mudanças em nós: uma determinada frase, dita ou escutada, uma experiência de vida que tocou nosso coração, uma pergunta que nos tirou de nossa maneira habitual de pensar… são sementes para transformações posteriores.
No caminho de Emaús, Jesus, como mestre sábio na arte da conversão, parte da situação existencial em que os dois discípulos se encontravam naquele momento: provoca-os para que falem à vontade das causas de sua tristeza. No fundo do coração dos discípulos há um grande vazio que, inconscientemente, querem preencher “conversando e discutindo entre si”.
Claro que muitas vezes em nossa caminhada da vida, temos medo, tristeza, decepções e expectativas frustradas, que nos impedem de ver em Jesus o Cristo e perceber caminhos alternativos ou até, ouvir sua voz.  Muitas vezes andei como esses discípulos, mas aí, veio o milagre e meus olhos se abriram. Aconteceu o encontro com Jesus!
A pergunta de Jesus sobre o problema que causava tamanho sofrimento neles foi o ponto de partida para encontrar a resposta que, no fim do itinerário, iria esclarecê-los, iluminá-los e devolver-lhes a alegria e a esperança perdidas. Aqui está uma sugestão de conversa, diálogo com o outro.
A pergunta de Jesus (“o que ides conversando pelo caminho?”) faz com que os discípulos levantem os olhos do chão e olhem para o rosto do peregrino desconhecido. Sem perceber começam a sair de seu fechamento e a alegrar-se porque alguém está interessado em saber quais são as causas de sua tristeza e quer ouvi-los.
A pedagogia amorosa de Jesus deu certo: eles abrem o coração e contam “o que aconteceu a Jesus de Nazaré”. No entanto, o que aconteceu com Jesus não é contado por um coração ardente e exultante, mas por um coração ferido, desiludido e triste. A resposta dos discípulos é um resumo do querigma cristão; mas esse conteúdo é relatado como uma tragédia irreparável.
Depois de uma longa conversa com o peregrino, os discípulos não discutem mais entre si, mas unânimes, insistem para que ele permaneça com eles naquela noite. O pedido “permanece conosco”, expressa o desejo de ser discípulo(a) de Jesus. Depois que o estranho peregrino – Jesus - aceitou o convite, a casa de Emaús, em vez de tornar-se um lugar de fuga e fechamento, como os discípulos pretendiam, tornou-se um lugar de acolhida e de partilha, de iluminação e ponto de partida para a retomada da comunhão com a comunidade dos demais companheiros.
O diálogo é consubstancial ao cristianismo. Deus é Palavra criadora e geradora de vida, mas em Jesus ela se manifesta como uma grande conversação. Sua presença junto aos discípulos de Emaús e  possibilita a passagem de uma “conversa e discussão” marcada pela tristeza, dor e fuga, para uma nova conversação, cheia de sentido e alegria. Os dois discípulos viveram uma verdadeira “páscoa”, pois passaram da discussão ao reconhecimento, do fechamento à abertura, do lamento ao agradecimento, do desânimo ao entusiasmo. Em suma,  a “passagem” do coração vazio e duro para o coração transbordante e abrasado. A nova conversação os arranca da solidão e os faz retornar à comunidade para relatar a boa nova da experiência que fizeram. Conversação expansiva, desencadeadora de outros relatos vitais. E assim, os laços são reatados.
A gente sabe que com uma posição conservadora, estática, rígida, é muito difícil que haja uma verdadeira conversação. Desse modo não há mudança, não há transformação. Fica-se igual a música Gabriela “nasci assim, vou morrer assim”. Mas com Jesus, aprendemos que é preciso sair de si mesmo, colocar-se em marcha. Com e em Jesus, há mudança.
Quando há dialogo, conversação, abertura, acontece a uma mútua atualidade da presença, e, um modo de comunicação no qual toda a pessoa se expressa, com gestos e palavras. É a passagem para a comunhão, a paz, a iluminação, a mudança de si e do outro.
Voltando pro texto, vemos que  o desvendar dos olhos ocorre durante a “fração do pão”. Nesse momento os olhos dos discípulos se abriram e reconheceram Jesus. A fração do pão para eles foi o “sinal por excelência da presença do Ressuscitado, o lugar onde eles podem e devem descobrir essa presença e a partir do qual poderão dar testemunho da Ressurreição” (J. Dupont). Andar com Jesus é ouvir com atenção e deixar-se cativar pela sua Palavra. Sentar-se à mesa com Ele e deixar que Ele parta e reparta o pão da vida. O reconhecimento e reencontro acontecem sob a palavra e na ceia (eucaristia). “O reconhecimento do Senhor vivo e o reencontro com ele acontecem sob a sua palavra e à mesa; ali ele está presente como divino viajante e hóspede” (W. Grundmann, p. 443). A  fé reconhece Jesus na sua palavra, no pão e no cálice da Santa Ceia.
E, depois de reconhecê-lo, é necessário realizar imediatamente o “caminho de volta” para a comunidade, para partilhar com os outros a experiência do encontro com o Senhor, professar juntos a fé comum e realizar as obras do Reino.
É essa experiência que, em última instância, muda nosso modo de pensar, de sentir e de agir. É essa experiência que nos converte em seus (suas) discípulos(as) e seguidores(as). Os caminhos que levam ao encontro com Jesus podem ser os mais diversos e mais ou menos longos, mas a experiência do encontro pessoal com Ele é imprescindível para conhecê-Lo.
Fazer o caminho com os discípulos de Emaús é uma privilegiada oportunidade para recuperar o lugar e o sentido da conversação nas nossas diferentes relações pessoais.
A graça de Deus pode nos atingir nos caminhos mais variados e inesperados: passando pelas fendas de nossa existência, pelas brechas abertas em nós pelas grandes decepções, ou soprando as últimas brasas que, sob as cinzas da desilusão, ainda permanecem acesas.
Jesus é invisível, porém está conosco a caminho. Em momentos de recolhimento íntimo e de reflexão silenciosa o peregrino Jesus está conosco. Jesus segue ao nosso lado. Com a sua palavra ele estende a mão ao nosso encontro para nos amparar, abrir a nossa compreensão, nos orientar e fortalecer o espírito, integrando-nos em sua comunhão de vida. No encontro ele nos abençoa e nos transforma em pessoas melhores.
O reconhecimento de Jesus nos põe a caminho em busca dos seres humanos. Os discípulos de Emaús foram a Jerusalém para encontrar-se com os outros discípulos. Qualquer lugar de nossa vivência poderá tornar-se a nossa Emaús, que, pela experiência do Cristo vivo, nos leva ao encontro com os irmãos em alguma Jerusalém da vida. O encontro com Jesus leva à comunhão e envia ao mundo para testemunhar o Cristo vivo. O que enche o coração faz os lábios transbordarem. Deus nos abençoe!! Odete Liber