Hoje, um belo domingo,
fiz tudo que não planejei. Havia planejado ir à igreja cedo, depois voltar pra
casa e andar na praia... Pois bem, acordei cedo e fui fazer relatório final pra
reunião de amanhã, a qual não estarei presente. E lá se foi mais uma manhã...
Almocei. Depois fui
olhar minhas plantas, sentir o cheiro de algumas, o céu lá fora cinza, dia de
uma chuva fina... E com isso viajei. E pra você, como é pegar aquele tempo ou ter o cheiro dele? Lembrar da infância,
de quando a gente ia para escola ? os primeiros amores platônicos? Nesses casos
a memória remete as cores, aos sabores e aos sentimentos. Lembra da dança, da brincadeira, do fim da
tarde, os sorrisos na roda e aquele toque? Lembrar do que já tivemos, fizemos,
sonhamos e não realizamos, das surpresas da vida?
É o tempo tem dessas coisas de guardar tudo em um baú vivo, a gente, de
modo que não há outra maneira de acessá-lo se não entrando nele e se deixando
tocar por tudo que está em seu fundo. Esse fundo que não está longe da gente,
pois está aqui grudado, colado em nós, porque o tempo é coisa de narrador e quem
narra faz a história viver. E me recordei de tanta coisa. Momentos bons, outros
nem tanto, outros ruins, outros maravilhosos...
Por isso, te proponho que
experimente olhar pra você, pro seu báu e experimente, proponho que feche os seus
olhos e vá para aquele lugar onde tudo começou, mas pode, se quiser, ir para um
pouco antes ou um pouco depois, afinal não importa o ponto de partida porque é
na viagem que a gente se encontra, se emociona, faz lágrimas correrem e risos
aparecerem.
E nessa viagem para o passado, selecione o que for possível, capte as
intensidades, reviva as sensações, as emoções, o calor ou o frio, o estado de
estar e sinta o que puder. Sinta e revivencie, pegue-a e transforme em
experiência. De olhos ainda fechados e consciente da respiração, reveja nas
arestas desse lado de lá os desdobramentos dos acontecimentos, as aparências em
suas essências, como espumas do mar que guardam oceanos. Os cheiros, aromas. Banhe-se e na pele, na
flor da pele, perceba a mistura se dando, o encontro avançando e os elos se
formando, como correntes que não prendem, mas que puxam, transmitem e
interligam. Ou então como laços que não amarram, mas que unem e aproximam,
mesmo na distância dos intervalos. Se emocione, viva e continue.
Continue de olhos fechados, sonhando, imaginando, busque outros lugares,
outros pontos, que até podem não ser tão doces assim, porque por vezes vem a
observância de um medinho, de uma ânsia, de confusões, mas no geral há uma
calma e confortável sabedoria de que tudo vale a pena. Voltar vale a pena!
Então como uma roda de bicicleta que gira fazendo barulhinho, zunindo naquele
silêncio sem pressa, lembre do sorriso espontâneo, por nada e por tudo. E o
gosto da bebida ou comida , de um perfume que se vai sem mesmo saber que se
foi, mas ainda sim saber que foi bom!
Então, não é que temos mesmo o nosso próprio tempo!
Viajar no tempo, trazer a memória momentos passados é se deixar cair e aos poucos se permitir
olhar pro passado como experiência. Lembrar de pessoas queridas, porque o
vínculo perdura, atravessa o tempo, liga como cola e cola porque corresponde,
um dizendo sim e o outro também. Ter o próprio tempo, o nosso, é antes um compartir,
um partir juntos para algum lugar. De olhos fechados, inspirando e expirando
tudo isso, ter o nosso próprio tempo é indizível, impalpável, proibido até, mas
é revivido no privilégio de um retorno encontro sempre atualizado. E nos fazer
rememorar momentos, cheiros que se passaram mas que guardamos dentro de nós e
os tornamos presente em nosso tempo. Vida que segue, relembrando o que foi, o
que escorreu pelas nossas mãos, saudades que permanecem, amor que ficou
guardado no fundo, vitórias e derrotas, mas em tudo uma aprendizagem,
crescimento!
Pois bem, com isso, o tempo não é
bom agricultor. Não é a função dele. O tempo só passa. Quem tem que arar o
solo, somos nós. Quem arranca plantações é o vento; Quem faz crescer é a chuva.
O tempo… Só passa e a gente segue a caminhada da vida, com cheiros e aromas...
Odete Liber
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